Pular para o conteúdo principal

Síria, onde os pais não sabem se as crianças voltarão da escola...


O testemunho de Samaan Daoud, refugiado cristão sírio que fugiu com sua família para a Itália
Por Federico Cenci
Roma, 20 de Outubro de 2015 (ZENIT.org)
"Eu sou um sírio e um cristão, sou de Damasco, nascido e criado apenas alguns metros de distância do lugar onde São Paulo se converteu. Tenho muito orgulho da minha origem”. Com essas palavras solenes e cheias de emoção, Samaan Daoud, refugiado cristão sírio, começou a narração da sua experiência durante o congresso “A Jihad, do Oriente à nossa casa”, que aconteceu na tarde de ontem, 19 de outubro, na Sala dos Grupos parlamentares, em Roma.
Samaan, pai de família, em um italiano perfeito, explicou que mudou-se para a periferia de Damasco quando se casou. Morava em uma região residencial, tranquila, pelo menos até março de 2011, data do começo do conflito que está destruindo a Síria.
Mas a onda de ódio não poupou nem sequer os lugares mais distantes dos centros de poder da capital síria. A sua casa, em particular, encontrava-se em um ponto central da batalha entre o exército regular e os grupos rebeldes. “Os tiros de morteiros chegaram ao jardim de casa”, disse.
Acima de tudo, metaforicamente, tais tiros chegaram ao seu coração, causando-lhe feridas que o tempo não poderá apagar. O homem lembra que um tiro de morteiro, um dia, levou um dos seus filhos e atingiu de morte outra criança na saída da escola. “A cada dia, na Síria, quando os pais enviam as crianças para a escola sabem que poderiam não voltar para casa”, explica.
Além disso, entre as dezenas de milhares de mortes que a guerra provocou na Síria, muitos são crianças. Dos quase 4 milhões de refugiados, quase a metade são crianças. Números que testemunham como as vítimas principais da guerra sejam os mais inocentes.
E que testemunham, ao mesmo tempo, o estado irreprimível de tensão em que vivem os sírios. "O grito Allah akbar tornou-se maldição para nós, porque cada vez que eu o ouvíamos compreendíamos que estavam chegando os grupos terroristas para trazer-nos a guerra, e não a benção do Senhor”, afirma Samaan.
O grito sinistro tornou-se sempre mais frequente aos seus ouvidos e dos seus vizinhos de casa, também quando se mudou de novo para o centro de Damasco. Há um ano e meio, mais ou menos, os rebeldes começaram a usar mísseis mais fortes nesses lados, de longo alcance, capazes de atingir também o coração da capital síria de lugares bem distantes.
A situação tornou-se tão insuportável que, não sem partir o coração, ele e sua família decidiram abandonar sua terra e mudar para a Itália, onde Samaan viveu por vários anos durante os estudos universitários.
A família Daoud está, há um mês, na Itália, mas deixou o coração e a mente na Síria. Quase emocionado Samaan recorda a condição da Síria hoje. Quando estava em Damasco, muitas vezes, acompanhou jornalistas italianos para ser tradutor. Os seus olhos viram a deterioração causada pelo ISIS, "em aldeias não apenas cristãs, mas também muçulmanas", frisa. E acrescenta: "Por que estes terroristas estão matando todos aqueles que não estão dispostos a aceitar a sua linha".
No futuro o Oriente Médio poderia encontrar-se com mais nenhuma presença cristã. Na Síria - reflexão de Samaan – os cristãos eram "o fermento", porque embora representando 10% da população, era dentro da sua comunidade que pulsavam a cultura e o fermento industrial.
Por um lado Samaan diz que inveja aqueles que permaneceram na Síria, porque “são mártires vivos, que ainda caminham – diz - . São pessoas que não foram mortas, mas que levam a cruz cada dia”. Cruz que se manifesta nestes meses, sob forma de falta de água e de luz elétrica, em grandes regiões populares de Damasco assediadas pelos tiros de morteiro.
Na conclusão de seu discurso Samaan citou o escritor e filósofo libanês Kahill Gibran, que, em seu livro “As tempestades”, de forma poética descreve as perseguições do passado e prenuncia a experiência trágica que está vivendo ainda hoje o Oriente Médio: “Mas, a minha família não morreu rebelando-se, e nem sequer destruída pela guerra e nem sequer pelos detritos de durante um terremoto. A minha família morreu crucificada”.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Soneto de Dom Pedro Casaldáliga

Será uma paz armada, amigos, Será uma vida inteira este combate; Porque a cratera da ... carne só se cala Quando a morte fizer calar seus braseiros. Sem fogo no lar e com o sonho mudo, Sem filhos nos joelhos a quem beijar, Sentireis o gelo a cercar-vos E, muitas vezes, sereis beijados pela solidão. Não deveis ter um coração sem núpcias Deveis amar tudo, todos, todas Como discípulos D'Aquele que amou primeiro. Perdida para o Reino e conquistada, Será uma paz tão livre quanto armada, Será o Amor amado a corpo inteiro. Dom Pedro Casaldáliga

UM CORPO ESTENDIDO NO CHÃO

 Acabo de vir do Largo de Pinheiro. Ali, na Igreja de Nossa Senhora de M Montserrat, atravessa  a Cardeal Arcoverde que vai até a Rebouças,  na altura do Shopping Eldorado.   Bem, logo na esquina da igreja com a Cardeal,  hoje, 15/03/2024, um caminhão atropelou e matou um entregador de pão, de bike, que trabalhava numa padaria da região.  Ó corpo ficou estendido no chão,  coberto com uma manta de alumínio.   Um frentista do posto com quem conversei alegou que estes entregadores são muito abusados e que atravessam na frente dos carros,  arriscando-se diariamente. Perguntei-lhe, porque correm tanto? Logo alguém respondeu que eles tem um horário apertado para cumprir. Imagino como deve estar a cabeça do caminhoneiro, independente dele estar certo ou errado. Ele certamente deve estar sentindo -se angustiado.  E a vítima fatal, um jovem de uns 25 anos, trabalhador, dedicado,  talvez casado e com filhos. Como qualquer entregador, não tem direito algum.  Esta é minha cidade...esse o meu povo

Homenagem a frei Giorgio Callegari, o "Pippo".

Hoje quero fazer memória a um grande herói da Históra do Brasil, o frei Giorgio Callegari. Gosto muito do monumento ao soldado desconhecido, porque muitos heróis brasileiros estão no anonimato, com suas tarefas realizadas na conquista da democracia que experimentamos. Mas é preciso exaltar estas personalidades cheias de vida e disposição em transformar o nosso país numa verdadeira nação livre. Posso dizer, pela convivência que tive, que hoje certamente ele estaria incomodado com as condições em que se encontra grande parte da população brasileira,  pressionando dirigentes e organizando movimentos para alcançar conquistas ainda maiores, para melhorar suas condições de vida. Não me lembro bem o ano em que nos conhecemos, deve ter sido entre 1968 e 1970, talvez um pouco antes. Eu era estudante secundarista, e já participava do movimento estudantil em Pinheiros (Casa do estudante pinheirense - hoje extinta), e diretamente no movimento de massa, sem estar organizado em alguma escola,