Será possível conciliar o Leste e o Oeste da Ucrânia?


8 DE ABRIL DE 2014 - 19H06 

Os recentes acontecimentos no Leste da Ucrânia são provas convincentes de que a população de língua russa (e a de língua ucraniana também) não pretende tolerar os neonazistas, exportados para lá do Oeste do país, inclusive a partir da região de Ivano-Frankovsk.


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Parece que a única maneira de sair desta profunda crise política e ideológica, quando formalmente num mesmo território existem duas Ucrânias, é a sua federalização.

A região de Ivano-Frankovsk tornou-se uma espécie de símbolo daquela Ucrânia que está orientada para o Ocidente e está disposta contra a Rússia. Claro, não se trata de toda a população da região mas de sua parte politicamente ativa que é, de fato, quem tem mais influência. A orientação política, cultural e histórica da região de Ivano-Frankovsk, que juntamente com as regiões de Lviv e Ternopol eram conhecidas como Galícia, é devida a uma série de eventos-chave. Primeiro de tudo – à longa permanência (desde o século 15) desta região na Polônia e Império Austro-húngaro.

Este território só passou a fazer parte da República Soviética da Ucrânia apenas na virada das décadas de 1930-1940, e não se pode dizer que o processo tenha corrido sem problemas, tendo em conta a invasão iminente da União Soviética pelas forças de Hitler. Basta recordar o simples fato da criação entre os habitantes locais da divisão Galizien da SS.

É curioso que, tendo sentimentos claramente antirrussos, muitos habitantes da região de Ivano-Frankovsk não sentem simpatia para com os polacos, alemães e austríacos que participaram no destino de sua pátria. Muitas vezes até os odeiam, construindo sua base ideológica sobre um ódio total a forças externas e sobre sua exclusividade, misturada, além de tudo, com antissemitismo. O deputado da Suprema Rada (parlamento) da Ucrânia Alexander Golub notou as grandes diferenças entre a Ucrânia ocidental e oriental:

“Há uma grande diferença na compreensão cultural e religiosa, na experiência histórica. Durante um tempo bastante longo as regiões ocidentais estiveram sob a influência de certos países – Áustria, Alemanha, Polônia. Durante esse período, as pessoas que vivem lá eram educadas no ódio a tudo que tem a ver com a Rússia ou a União Soviética: à língua, à cultura e à fé. Não é por acaso que foram nessas regiões que surgiram os uniatas – representantes da Igreja Greco-Católica Ucraniana, que obrigaram os habitantes do Oeste do país a abandonar a Ortodoxia.”

O analista político Dmitri Abzalov está convencido de que as regiões ucranianas apenas podem ficar juntas se receberem amplos poderes dentro de um Estado unitário e respeito pelos direitos de todos os cidadãos:

“A federalização permitirá preservar os interesses das regiões e territórios e proporcionar uma oportunidade para a atividade política das elites regionais. Isso, por sua vez, garantiria a preservação de sua independência. Na maioria dos casos, tais medidas são suficientes para resolver todos os problemas. Lembre-se da unificação da Alemanha. As federações são estruturas estáveis se, é claro, as autoridades conseguirem criar ferramentas de representação das regiões.”

Por enquanto, uma estrutura federal para a Ucrânia é uma grande questão em aberto. Ela existe como um projeto proposto por forças construtivas no país e no exterior, interessadas em paz e acordo comum. Mas as autoridades autoproclamadas em Kiev não estão dispostas a realizar uma reforma política e pública tanto radical, como extremamente necessária. Ora o confronto entre o sudeste e oeste do país vai crescer. Os últimos dias, infelizmente, confirmam a realização justamente desse cenário.

A parte nacionalista da população da Galícia é pouco susceptível de concordar com que seus heróis – Bandera e Chukevitch – tivessem sido criminosos e torturadores, inclusive do povo ucraniano. E não importa que é justamente com essas definições que concordam muitos ucranianos, judeus e poloneses que vivem em Ivano-Frankovsk e arredores. Hoje a vontade é ditada por pessoas armadas.

Assim, com o consentimento tácito de Kiev, defendendo e impondo seus próprios ideais, se assim se pode dizer, os neofascistas podem conseguir que a Ucrânia deixará de existir em suas fronteiras atuais. O sudeste do país nunca aceitará a visão da Ucrânia ocidental da história, do presente e do futuro do Estado sob as bandeiras de Bandera. O outro caminho – o federativo – pode reconciliar os atuais adversários ideológicos. Claro que, numa base mutuamente aceitável.

Fonte: Voz da Rússia

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