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Morre Bellini, o capitão brasileiro que eternizou gesto com a taça na Copa de 58


Bellini ergue a Taça Jules Rimet após a final de 58: gesto que se transformaria em um ritual (© Gazeta Press)

























Aos 83 anos, Bellini cansou-se da luta com o Mal de Alzheimer,
 que o acometia há mais de dez anos, e morreu em São Paulo
Foi naquela tarde de 29 de junho de 1958, na Suécia,
que Hideraldo Luiz Bellini entrou para a história do
esporte mundial, de maneira quase intuitiva. Só o fato
de ser o capitão do primeiro título em Copas do Mundo
da seleção brasileira já poderia lhe conferir o a glória.
Mas o destino foi além, mais caprichoso. Diante da
euforia da conquista, os fotógrafos brasileiros presentes
 no Estádio Nya Ullevi, em Estolcomo, pediram ao beque
 da seleção para lhes mostrar a taça Jules Rimet.
Bellini não hesitou. No alto de seu 1,82 metro, o zagueiro
 que se destacava mais pela personalidade e pela
virilidade do que propriamente pela técnica, agarrou a
Copa e a ergueu com as duas mãos para o mundo
inteiro observar. Não seria exagero dizer que Bellini,
naquele simples gesto, mudou a história. Não é mesmo
 exagero. A imagem de um capitão com os dois braços
esticados e a taça acima, reluzente e orgulhosa, era inédita.
E nunca mais saiu do imaginário popular. Seja o esporte
 que for, na conquista em que for, o gesto é repetido ainda
nos dias atuais. Uma reverência eterna a Bellini.
"Não foi nada programado. Os fotógrafos que pediram",
costumava dizer o zagueirão.
Aos 83 anos de idade, Bellini cansou-se da luta com o
Mal de Alzheimer, que o acometia há mais de dez anos,
e nesta quinta-feira (20/03) faleceu em São Paulo, onde
estava internado em quadro crítico, agravado por uma
parada cardíaca. O homem que, em um gesto, deu um
bico no complexo de vira-lata que assolava o Brasil desde
o Maracanazzo da Copa de 1950. E, ironias do destino,
ali na entrada do Maracanã, virou estátua. Ainda que movido
 pelo boca a boca do povo. Em 1960, dois anos após a
conquista na Suécia, uma estátua de bronze que reproduzia
 gesto de Bellini com a Jules Rimet foi forjada pelo artista
 plástico Mateus Fernandes.
Era uma iniciativa do empresário Abraham Medina, pai de
 Roberto Medina, criador do Rock in Rio. Até hoje, a inspiração
 da estátua é coberta de mistérios. Oficialmente, a homenagem
 é dedicada aos campeões de 1958. Mas há quem diga que
 o rosto na escultura é de Francisco Alves, o Rei da Voz, cantor
 de rádio que arrebatava multidões nas décadas de 40 e 50 e
 que falecera em 1952 em um acidente automobilístico. A placa
 da estátua, inclusive, traz o grifo de "Rei de Voz". Há, também,
quem diga que o rosto ali esculpido é de Hamilton Sparra, um
 modelo, e não do capitão da primeira seleção brasileira
campeã do mundo. Para o torcedor que frequenta o Maracanã,
 pouco importa. Seja ele do Vasco, clube defendido pelo zagueiro
 por dez anos, ou dos rivais Flamengo, Botafogo, Fluminense,
América ou Bangu, aquela homenagem tem nome. É a Estátua
 do Bellini, ponto de referência na entrada do Maracanã e alvo de
 fotos dos mais curiosos fãs do esporte bretão que passam pelo
mítico estádio carioca. Se a estátua não se fez Bellini, o proprio
Bellini se fez estátua nos braços do povo.
Ali, na Cidade Maravilhosa, ele viveu seu auge na carreira profissional.
O jeito elegante e o porte atlético do jogador o fizeram ser
contratado pelo Gigante da Colina em 1952. Antes, Bellini
passara pelo Itapirense, de sua cidade natal, Itapira, no interior
de São Paulo, onde nascera em 21 de junho de 1930. Depois,
rumou para o Sanjoanense, de São Paulo, onde substituiria o
zagueiro Mauro, que seguira para o Santos. Dez anos depois,
o próprio Mauro substituiria Bellini como capitão da seleção
brasileira e repetiria o gesto de levantar a Jules Rimet para o
mundo observar o bicampeonato. Ironias da bola.
Ironia, diga-se, até que bem natural. Pois Bellini chegara à Copa
 de 1962, no Chile, ainda como capitão da equipe. Mauro, com os
 mesmos 32 anos, não teria gostado e reclamou com o técnico
Aymoré Moreira. Diante de uma possível crise de egos que poderia
 pôr em risco o bicampeonato mundial brasileiro, Bellini concordara
 em ceder a vaga ao companheiro, que admitia estar em melhores
 condições. A partir dali, Bellini e Mauro viraram grandes amigos.
A atitude de Bellini surpreendeu. Afinal, tratava-se do capitão da
seleção brasileira de 1958, de personalidade forte. Muitos se
lembram que na final do primeiro caneco mundial, logo após o
primeiro gol sueco com minutos de partida, Didi caminhou até o
 meio do campo com a bola debaixo do braço bradando reação
 aos companheiros. Mas poucos sabem que foi Bellini o responsável
 por recolher a redonda das redes brasileiras e entregar nas mãos
 de Didi, instruindo-o a estimular os companheiros e evitar nova
decepção de um país que ainda se assombrava com o Maracanazzo
de 1950. O resultado é conhecido: Brasil 5 a 2 na Suécia, com
direito a golaço do menino Pelé. Ao seu lado, uma legião de craques
 como Garrincha, Zagallo, Nilton Santos, Gylmar, entre outros,
celebrava a conquista inédita.
O porte atlético e as feições com traços de elegância tornavam
Bellini um alvo em potencial das mulheres brasileiras. O capitão
da seleção de 1958 era, também, galã. Por isso, chegou a ser
acusado por dirigentes do Vasco, no Campeonato Carioca do mesmo
ano, a abusar das farras em Copacabana e contribuir para a má fase
 do time. As acusações irritaram o campeão mundial, que reagiu junto
 dos companheiros e levantou o título daquele ano. Pelo Vasco, aliás,
colecionou mais dois Cariocas, uma Copa Rocca e um Torneio
Rio-São Paulo. E, afinal, Bellini sempre fora apaixonado por Giselda,
sua mulher até o fim da vida.
Em 1961, Bellini trocou o Vasco pelo São Paulo, onde substituiu,
de novo, Mauro. Épocas difíceis. Isto porque aquele garoto que
surgira ao seu lado, na Copa de 1958, um tal de Pelé, andava a
barbarizar com a camisa do Santos, para onde também fora Mauro.
Títulos pelo Tricolor do Morumbi não houve até 1967. À essa altura,
já com a terceira Copa do Mundo no currículo, ao fazer parte dos
convocados de 1966, Bellini decidiu se aventurar. E, corajosamente,
saiu do eixo Rio-São Paulo ao vestir as cores do Atlético-PR de
1968 a 1969. Em Curitiba, Bellini também não conquistou títulos,
mas reencontrou o amigo Djalma Santos, dos tempos de seleção
brasileira.
Aos 39 anos, Bellini resolveu pendurar as chuteiras. Ao lado de sua
Giselda, viveu de forma mais pacata, longe dos holofotes dos anos
50 que o fizeram estrelar comerciais e até a fazer testes para ator,
o que contribuiu para sua fama de galã. Foi dono de uma rede de
supermercados, de uma confeitaria e na década de 70 se formou
em direito, conseguindo até passar no exame da ordem para ter a
 carteira de advogado. Mas a profissão, mesmo, nunca exerceu.
Bellini continuava a sonhar com a bola em suas escolinhas do seu
 amado futebol. Em 2008, compareceu à homenagem feita pelo
então presidente Lula aos campeões de 1958, em referência aos
50 anos da conquista primeira Copa do Mundo, na Suécia. Há pouco
 mais de três anos, Bellini perdeu a fala devido ao agravamento do
Mal de Alzheimer. Filho ilustre de Itapira, recebeu homenagens de
 vida. E ali nos passeios por Higienópolis, onde morava com esposa
 Giselda, quem o reconhecesse dificilmente deixaria de apontar
aos amigos: ali estava Hideraldo Luiz Bellini, o capitão da seleção
de 1958. O homem que, em um gesto, mudou a história do esporte
 mundial, fez-se estátua. E, por consequência, tornou-se imortal.
GALERIA Bellini, capitão do primeiro título mundial da seleção
 brasileira, em 1958


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